Vivemos numa época em que a
ciência e a tecnologia tornaram o mundo pequeno. Nossa compreensão da natureza
e a expectativa de vida atingiram níveis nunca sonhados na história da
humanidade. Pessoas de diferentes partes do mundo estão agora conectadas de
forma instantânea e as ideias podem ser compartilhadas sem esforço. O homem
conquistou cada recanto do planeta, sejam as montanhas mais altas, as grandes
florestas tropicais, os desertos, as vastidões geladas dos polos e até as
profundezas abissais dos oceanos. Temos um posto avançado com tripulação
permanente em órbita da Terra, que é a Estação Espacial Internacional, já fomos
à Lua, enviamos sondas robóticas que exploraram cada planeta do Sistema Solar e
suas luas. Nas próximas décadas chegaremos à Marte e já vislumbramos formas de
alcançar as estrelas inimaginavelmente distantes. Mas apesar de todas estas
espetaculares realizações da vontade, da coragem e do intelecto humanos, a
ciência, nossa principal ferramenta nestas conquistas, ainda sofre ataques e é
vista com desconfiança por boa parte das pessoas.
Mais do que nunca, o fanatismo
religioso, as superstições, seitas, crenças fantásticas, curas milagrosas,
teorias da conspiração e pseudociências, ganham espaço. Fico abismado com a
quantidade de pessoas (muitas delas inteligentes e instruídas) que acreditam em
coisas como horóscopo, experiências fora do corpo, alienígenas ajudando
civilizações antigas, curas quânticas e outros absurdos sem qualquer base na
realidade (quando acreditam que exista uma realidade!). Sou um entusiasta da
ciência, ainda que leigo, e muitas vezes, quando converso com amigos e tento
contrapor algumas destas crenças com as teorias científicas bem estabelecidas,
frequentemente ouço coisas como “mas são só teorias”, “isto é o que diz a
ciência tradicional”, “isto é o que diz o pensamento cartesiano” e até mesmo “a
ciência nunca conseguirá explicar isto”, finalizando com “você tem que manter a
mente aberta”. Cheguei à conclusão que estas afirmações são consequência de um
desconhecimento em relação ao uso correto do termo “teoria” e da adesão
exagerada à ideia de “manter a mente aberta”.
A palavra teoria costuma ser
muito confundida com hipótese, ou pior ainda, com palpite. Mas quando se fala
em teoria, cientificamente falando, trata-se de um enunciado ou um conjunto de
enunciados que tentam explicar a ocorrência de um fenômeno natural, que foram
postos à prova repetidas vezes através de experiências em ambientes controlados
realizadas por diferentes pessoas ao redor do mundo e que podem ser
reproduzidas por quem quiser e interessar. São hipóteses que foram testadas
exaustivamente e são amplamente aceitas pelos especialistas da área e que às
vezes recebem até mesmo a denominação de “lei”, como por exemplo a lei da
gravidade. Mas mesmo as teorias mais sólidas não são tratadas como verdades
absolutas. Apesar das pedras sempre caírem em direção ao solo quando as
soltamos, se algum dia alguém soltar uma pedra e ela flutuar, e esta
experiência puder ser reproduzida em um ambiente controlado, as teorias que
explicam a gravidade terão que ser revistas e uma nova e aperfeiçoada teoria da
gravidade será proposta. Abandonar uma teoria equivocada e substituí-la por uma
outra mais próxima da realidade do fenômeno que se quer explicar, não pode ser
considerada uma fraqueza do método científico, mas sim, sua força, já que desta
forma a ciência se aperfeiçoa e suas bases se tornam cada vez mais sólidas.
Método científico: Como nasce uma teoria. |
Uma outra forma muito utilizada para
se tentar justificar as crenças mais absurdas é a ideia de que devemos manter “a
mente aberta para todas as possibilidades”. Vem do fato que na história da
ciência, várias hipóteses tidas como absurdas em determinada época se tornaram
as ideias mais aceitas no futuro, como aconteceu por exemplo quando a Teoria da
Relatividade de Einstein substituiu a Gravitação Universal de Newton como
explicação mais precisa para a gravidade, entre diversos outros exemplos. Quem usa
este raciocínio deixa de observar duas coisas: 1) Para cada hipótese
controversa que posteriormente se tornou aceita e revolucionou nosso
conhecimento do universo, existem milhares que se provaram ser realmente falsas;
2) Hipóteses controversas que revolucionaram nosso conhecimento do universo
foram postuladas por pessoas que conheciam muito bem as teorias estabelecidas na
época e que provaram seus pontos de vista junto a seus pares utilizando-se do
método científico.
É claro que devemos manter a
mente aberta para novas ideias e conceitos, mas sempre tomando muito cuidado
com a origem da informação e a intenção de quem a transmite, para não nos
tornarmos vítimas de charlatões que agem de má fé ou passar desinformação adiante
por pura ignorância. Para isso, um pouco de ceticismo e a compreensão do que é
realmente o método científico são fundamentais. Existe uma frase que é
atribuída ao grande astrônomo e divulgador da ciência Carl Sagan: “Devemos
manter nossas mentes abertas, mas não a ponto de deixar que o cérebro caia pela
abertura.”
Os que possuem cérebros pequenos têm razão em ter medo de abrir a mente. O cérebro pode cair pela abertura.
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