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sexta-feira, 1 de maio de 2015

A Vida na Sarjeta – O Círculo Vicioso da Miséria Moral, de Theodore Dalrymple

Theodore Dalrymple é o pseudônimo do médico psiquiatra britânico Anthony Daniels, que está sendo chamado pela crítica de “o novo George Orwell”. Neste livro ele escreve sobre a violência e a pobreza na underclass britânica – aqui traduzida como subclasse –, criminosos, viciados, mendigos, e outros homens e mulheres desempregados e sem qualificação, vivendo miseravelmente à margem da sociedade. Mas diferente de outros autores, Dalrymple não cai nas explicações fáceis do senso comum e nas justificativas progressistas que normalmente acompanham o tema e o explicam pela simples associação entre a pobreza e a violência, e tudo resumem à luta de classes, discriminação e exploração capitalista. Ele nos mostra que na verdade a pobreza não é o fator preponderante na explicação do fenômeno da violência; que pior que ela são a impunidade e a destruição de valores fundamentais à civilização e ao bom convívio social. Com a bagagem de quem trabalhou mais de vinte anos em uma prisão e num hospital localizado em uma das áreas mais pobres da Inglaterra, ele nos explica que muito mais que fatores econômicos, a raiz do problema está nas ideias amplamente disseminadas por intelectuais, artistas e políticos progressistas da vitimização e do relativismo moral, que retiram a responsabilidade individual e põe toda a culpa na sociedade.

Theodore Dalrymple
Os casos de violência descritos no livro, relatados com extrema crueza por Dalrymple, certamente deixariam intrigados os intelectuais brasileiros, que tem o irritante hábito de explicar a violência jogando tudo na conta do capitalismo, luta de classes, racismo, favelização, violência policial, e, principalmente, na ineficiência do governo, que falha na entrega de serviços públicos como educação, saúde e moradia dignas e de qualidade, e que serve apenas às classes mais abastadas da sociedade. Os pacientes dele em sua maioria são brancos, desfrutam de todos os benefícios do welfare state europeu e tem garantidos moradia e suporte financeiro do governo, e por viverem em um dos países mais ricos do mundo, não podem reclamar de falta de acesso à educação, segurança e saúde de qualidade. Então por que há tantos viciados em drogas, assaltos e violência contra a mulher da Inglaterra de Dalrymple? Resposta: observe o que os intelectuais, artistas e políticos progressistas estão fazendo à sociedade. O fenômeno é universal.

Vivemos em uma época estranha de relativismo moral, em que é cada vez mais disseminada a ideia de que a culpa pelas transgressões individuais são da coletividade. Alguém comete um crime, seja um assalto ou um homicídio? A da culpa é da sociedade pela falta de oportunidades que o levou a cometer este ato de “desespero”; não dele, que o cometeu conscientemente. O viciado em drogas que está perecendo em um casebre imundo em condições inumanas de insalubridade? A culpa é da sociedade que criminaliza as drogas e discrimina o usuário; não da opção consciente dele pelo prazer temporário do uso de uma substância que sabidamente é tóxica e causa dependência. E a mulher jovem, mas que já teve vários filhos de diferentes pais e foi espancada por todos eles? Novamente a culpa é da sociedade que não dá educação; não da mulher que buscou o prazer fácil e irresponsável com homens violentos, muito menos de seus companheiros que a agrediram de forma covarde e impune. E a solução para estes e muitos outros casos? Segundo a intelligentsia: menos prisões, liberação de todas as drogas, sexo e prazer sem limites; e quando a violência, o vício, a doença e os filhos ilegítimos sem pais e mães baterem à nossa porta, é só o governo resolver tudo com mais auxílios!

A vida quase nunca é fácil e o mundo não é de forma alguma um lugar justo, mas se não assumirmos a responsabilidade por nossas decisões e acharmos que somos apenas vítimas passivas de uma sociedade cruel, nunca iremos prosperar. O ambiente cultural em que vivemos nos diz o tempo todo que podemos tudo e temos direito a tudo; que ser o mais esperto e se dar bem em tudo é um ideal – vejam os heróis dos filmes, novelas e livros! –; que coisas como a cortesia, o amor e a arte são cafonas e ultrapassados; e que o governo tem que resolver todos os nossos problemas. Estas ideias estão destruindo a civilização e afogando as pessoas em miséria – econômica, moral e cultural – e violência. Como diz o próprio Theodore Dalrymple ao final de sua introdução:


Nos textos a seguir tentei, primeiramente, descrever sem disfarces a realidade da subclasse e, então, revelar a origem desta realidade, que é a propagação de ideias más, insignificantes e insinceras. Não é necessário dizer que uma avaliação verdadeira das causas da miséria da subclasse é proveitosa, caso decidamos combatê-las e, principalmente, evitar soluções que só agravarão esse cenário. Se traço um quadro de um estilo de vida que é totalmente sem encanto ou mérito, e descrevo muitas pessoas pouquíssimo atraentes, é importante lembrarmo-nos de que, caso haja culpa, uma grande parte é devida aos intelectuais. Não deveriam ter sido tão tolos, mas sempre preferiram evitar-lhes o olhar. Consideraram a pureza das ideias mais importante que as reais consequências. Desconheço egotismo mais profundo.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

A Onda (The Wave, 1981)

Curta metragem A Onda

A Onda (The Wave, 1981) é um curta-metragem para a televisão dirigido por Alex Grasshoff e estrelado pelo ator Bruce Davison (o Senador Robert Kelly nos primeiros filmes dos X-Men). O filme é baseado em uma história real sobre um experimento realizado por um professor de história americano em sala de aula, que ficou conhecido como A Terceira Onda.

Bruce Davison
A Terceira Onda foi um experimento social realizado pelo professor de história e escritor americano Ron Jones, que em abril de 1967 dava aula para alunos do segundo ano da Cubberley High School, na cidade de Palo Alto, no estado da Califórnia, nos Estados Unidos. Esta experiência fez parte das aulas de Jones naquele ano sobre o mundo contemporâneo, como parte dos estudos sobre a Alemanha nazista.  Teve o objetivo de mostrar como uma população inteira foi praticamente hipnotizada pelos nazistas, provando que mesmo em uma sociedade democrática as pessoas não estão livres da conversão ideológica por líderes carismáticos.

Die Welle, filme alemão baseado em A Onda
Jones começou seu experimento sugerindo aos seus alunos que a democracia possui vários problemas, decorrentes do fato de valorizar em demasia o indivíduo e sua liberdade, o que incentivaria o egoísmo; e que o segredo para se conseguir uma sociedade mais justa e forte era a disciplina e o espírito de grupo. Através da adoção de um cumprimento que diferenciava os seus estudantes dos demais – que lembrava o saudação fascista de Mussolini –, a utilização de um uniforme pelos integrantes, e o desprezo ao alunos que não eram da turma, ele criou um grupo coeso e disciplinado, atento e receptivo a qualquer ideia que lhes fosse transmitida por seu líder – o próprio professor Jones. O lema criado foi “força através da disciplina, força através da comunidade, força através da ação, força através do orgulho”. Repetido à exaustão, este mantra deu as linhas mestras para os integrantes do grupo e se tornou o dogma a ser seguido sem contestação – quem questionasse algo era excluído. No fim o professor dissolveu o grupo e revelou aos alunos que tudo não passou de um experimento, e eles não acreditaram em como puderam ser manipulados tão facilmente.

A história também deu origem ao filme alemão Die Welle, de 2008, um longa-metragem com um enredo bem parecido, mas com uma conclusão mais trágica. A história de Jones também deu origem ao livro The Wave, do escritor Todd Strasser, que é a romantização dos eventos ocorridos durante A Terceira Onda.

Manifestantes da Marcha da Família com Deus no ano de 2014


The Wave, livro de Todd Strasser
Em nossos tempos onde tanta gente participa de passeatas pedindo a volta da ditadura militar no Brasil – como vimos recentemente na marcha da família e no aniversário de 50 anos do golpe militar de 1964 – é sempre bom refletir sobre os perigos do autoritarismo e da conversão ideológica. Muitos reclamam da democracia e tem sido muito difundida no Brasil hoje a ideia de que a corrupção é exclusiva do novo regime democrático brasileiro. Alega-se uma suposta inversão de valores e clama-se pela imposição de códigos morais mais rígidos na sociedade; mas tudo tem o seu preço, e o preço da liberdade é a convivência com valores diferentes dos nossos; mas o seu oposto – o autoritarismo – é um pesadelo em que a individualidade é sufocada em nome da ideologia oficial, concorde você ou não. E nesta distopia a corrupção encontra um terreno fértil e seguro para se disseminar (inúmeros escândalos de corrupção também ocorreram durante a ditadura militar). Basta uma pesquisa rápida na internet para encontrar aterrorizantes relatos sobre fatos ocorridos em regimes totalitários como o da China, Irã, Arábia Saudita, Coreia do Norte, Cuba, entre tantos outros; países onde não há liberdade de expressão, a internet e a mídia são controladas, e governos autoritários controlam rigidamente todos os aspectos da vida dos cidadãos; censurando abertamente livros, filmes, teatro, notícias, discursos, artigos científicos e qualquer coisa que seja considerada subversiva e contra os ideais do governo, regime, revolução, líder, entre outros; criados para serem adorados e obedecidos sem questionamento, sob o risco de prisão, tortura e até morte.


A Onda (legendado)


A Onda (dublado)

A Onda (Die Welle) 

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Pobre é pobre e bandido é bandido

Existe uma tendência a se reduzir o problema da violência no Brasil à questão da desigualdade social. A origem da violência estaria na falta de oportunidades e pobreza causadas pela desigualdade social e os criminosos seriam meras vítimas da sociedade. Esta é uma visão preconceituosa de quem só considera criminoso o pobre que comete crime. Sim, por que se pobreza fosse a origem do crime, não existiria tantos criminosos nas classes mais altas, nem pessoas tão dignas nas classes mais baixas da sociedade. Para ficar em apenas um exemplo, traficante é apenas aquele que vende drogas na favela ou aquele que vende drogas nas festas dos apartamentos de luxo Zona Sul também é? Rico que comete crimes não é criminoso? A pobreza sozinha pode ser considerada a responsável pela violência?

Todos os dias vários criminosos são presos e a muitos destes ostentam uma extensa ficha criminal. São presos diversas vezes após cometerem inúmeros crimes no prazo de poucos anos e serem soltos em pouco tempo, beneficiados por nossas leis frouxas. Nossos intelectualóides argumentariam que prisão não resolve o problema, que nossas prisões são escolas de criminosos, que estas pessoas cometeram crimes pela falta de oportunidades e pela histórica desigualdade social que assola o país, blá, blá, blá, blá, blá, blá. Eles então continuam sendo soltos e destruindo a vida de tantas vítimas por aí.

Policiais brasileiros fazem papel de idiota em sua dura e arriscada labuta de enxugar o gelo, e, no fim, a culpa é sempre da polícia por não usar de sua onisciência, onipresença e onipotência para impedir que o crime aconteça. Prender e encarcerar talvez não resolva o problema em definitivo, mas, passar a mão na cabeça e chamar de coitadinho com certeza não ajuda em nada. Um réu primário às vezes merece uma nova chance, mas e quem reincidiu uma, duas, três, dez, vinte vezes? A certeza da impunidade é um dos motores da violência. Se um criminoso efetivamente cumprisse a pena prevista no Código Penal para o seu crime (ainda que muitas vezes baixa), teríamos menos um problema por alguns anos e inúmeros crimes deixariam de ser cometidos por este indivíduo.


É como uma pessoa que teve cirrose hepática por ser alcoólatra. A causa é, entre outras, a bebida, mas parar de beber não a salvará, pois ela ainda teria um fígado destruído para cuidar. Se hoje por um milagre o Brasil se tornasse o país mais justo do mundo e sem desigualdade social, ainda teríamos milhares de criminosos matando, roubando, traficando drogas, estuprando, desviando recursos públicos, entre tantos outros crimes que ainda precisariam ser combatidos. A violência é um problema muito complexo e de difícil solução, pois esta depende de todos. Não adianta culpar apenas a desigualdade social e deixar de combater o problema. Nem adianta tratar o bandido como um coitadinho vítima da sociedade. Bandido é bandido e deve ser tratado como tal, seja ele pobre ou rico.