Imobilismo em movimento (Companhia das Letras, 2013), de Marcos
Nobre, professor de filosofia do IFCH-Unicamp e pesquisador do Cebrap, é um
livro que faz uma análise sobre a política e a economia do Brasil do período
que vai da redemocratização até os dias de hoje, com foco no PMDB e seu papel
como força conservadora que até hoje estaria freando o desenvolvimento pleno do
país. Segundo o autor, a influência exercida pelo PMDB cria um modo de fazer
política no Brasil que ele chama de “pemedebismo” que é a busca a qualquer
custo dos governantes por alianças amplas que possibilitariam a
“governabilidade”.
O primeiro capítulo, Do declínio do nacional-desenvolvimentismo à
estabilização: 1979-94, é uma análise, com foco na economia, dos primeiros
anos da redemocratização. Acompanhamos a criação dos principais partidos
políticos atuais, a criação da Constituição de 1988, a luta contra a inflação e
a conjuntura nacional e internacional que possibilitaram a criação do Plano
Real e a estabilização econômica do Brasil.
O segundo capítulo, A desigualdade no centro da disputa: o
sistema político polarizado dos anos FHC, fala sobre os bastidores do Plano
Real, a ascensão de Fernando Henrique Cardoso ao poder e seus dois mandatos
como presidente. Acompanhamos o tumultuado início do Real, as reformas, as
privatizações e os choques provocados por sucessivas crises econômicas
internacionais no final do segundo mandato. No plano político, o apoio do PMDB
a FHC e a polarização da política nacional entre o PSDB do presidente e o PT,
que realizou uma ferrenha oposição ao governo no período. Foi o período de luta
pela consolidação da estabilização econômica proporcionada pelo Real e pela
redução das desigualdades sociais, esta finalmente recebendo destaque, ainda
que tímido, na política nacional.
No terceiro capítulo, O social-desenvolvimentismo e o fim da
polarização: de Lula a Dilma, acompanhamos a chegada de Lula ao poder, seus
dois mandatos e os primeiros anos de governo de Dilma Rousseff. Com o Real
consolidado, o Brasil passa a focar no combate à pobreza, em um período que o
país conseguiu grande crescimento econômico com redução das desigualdades
sociais, mesmo após a crise internacional de 2008. No plano político vamos da
tentativa inicial de governar sem uma aliança ampla com o PMDB até o escândalo
do mensalão. Forte golpe na imagem do PT, o escândalo do mensalão foi
determinante para a entrada do PMDB no governo e apesar de ter impedido um
provável processo de impeachment do presidente Lula e ter possibilitado sua
reeleição e a sucessão por Dilma Rousseff, deixou cicatrizes profundas na
política nacional.
O último capítulo, Considerações finais, perspectivas: as
revoltas de Junho e tendências do novo modelo de sociedade, temos
especulações sobre as perspectivas do futuro e uma tentativa de explicar as
manifestações por todo o Brasil a partir de junho de 2013. Segundo o autor
estas manifestações são um reflexo do descontentamento da população com o ritmo
lento das mudanças no país e com a forma de fazer política personificada no
pemedebismo, ou seja, a busca por apoio amplo e o leilão de cargos no governo
como forma de garantir este apoio.
No final temos o anexo “Pemedebismo” e “lulismo”: um debate com
André Singer, sobre as divergências do autor com a análise política de André
Singer, professor do departamento de ciência política da USP, no livro Os sentidos do lulismo: reforma gradual e
pacto conservador (Companhia das Letras, 2012). Apesar do título do anexo,
nada tem de debate já que apenas apresenta suas críticas à referida obra, sem
participação do outro autor no texto, mas deixa um link do youtube para quem
quiser assistir em vídeo a um debate entre os dois realizado em outra ocasião.
O livro é uma boa análise da
história política e econômica recente do Brasil, mas parece defender uma tese
que particularmente não concordo, que é a de que a busca por apoio e consenso é
uma coisa ruim para a democracia. Acho que na realidade esta é a essência da
democracia e em nossa sociedade tão apática politicamente, sem uma opinião
pública influente, não há outra opção para governar. É muita ingenuidade pensar
que seria possível governar sem alianças. Todos concordam que o Brasil tem
muitos problemas e que suas soluções dependem de reformas drásticas em
determinadas áreas, então, como seria possível estas mudanças em um Governo que
esteja em guerra com o Congresso? Como um Governo aprovaria o orçamento e as
leis necessárias para a implementação de seus projetos? Todo presidente é um
refém do Congresso e mesmo com a força do início do mandato e apoio da opinião
pública, ainda assim ele depende de resultados para governar e boas intenções sozinhas
não são o suficiente. Você pode cruzar os braços e se negar a manter o diálogo
em nome da integridade ideológica, então verá seu governo engessado, afundando em
resultados ruins e ficará reclamando da falta de apoio, de como a política
nacional é podre, como a mídia é manipuladora e como o povo é ingrato. Estará atolado
até o pescoço em crises e no primeiro escândalo envolvendo algum membro de seu
governo (e eles sempre ocorrerão, já que não se pode garantir a integridade dos
milhares de pessoas nos cargos que são de sua responsabilidade direta ou
indireta), se verá em um processo de impeachment, será execrado pela opinião
pública e tachado de incompetente.
Quando se tem um país para
administrar e tocar para a frente, não tem jeito. Você terá que trabalhar com o
que tem à mão, e não existe um Congresso composto somente de Senadores e Deputados
íntegros e favoráveis ao seu Governo pelo bem da nação, nem um quadro de
milhões de servidores públicos honestos, motivados e interessados em colaborar com
suas ideias e pôr em prática seus projetos apenas porque estes são muito bons e
mudarão o Brasil para melhor. Os interesses pessoais, a incompetência e a
corrupção são uma realidade e não adianta ficar parado reclamando e clamando
por mudanças pois estas levam gerações e cabe a quem estiver no poder hoje aparar
as arestas e canalizar tudo isto de forma que as boas ideias se tornem
realidade. Talvez não da forma ideal ou mais eficiente, mas da forma possível
de acordo com as regras do jogo, dialogando e buscando o apoio aos seus
projetos, cedendo às vezes quando dentro de limites éticos, mas sempre em busca
da justiça, da melhoria na qualidade de vida da população e da diminuição das
desigualdades. Caso estes bens sejam alcançados, o esforço foi válido.
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